sexta-feira, 4 de março de 2011

Patrícia e "Mô", gourmet

Mulher Chorando, Pablo Picasso

A lua cheia brilhava no céu. O carro parou perto da praia. O vento brando trazia a maresia das ondas e o barulho da água arrebentando nos rochedos. O jovem estudante de veterinária não quis perder tempo. Abriu a porta e tirou a calça. Patrícia não saiu do veículo.
                - Que houve? Você não vem? Vamos fazer amor nas pedras! – Curvou o rosto na direção da janela com todos os dentes à mostra.
                - Não estou a fim.
                - Como assim? Você é tão espontânea. Está acontecendo alguma coisa? – Dobrou os braços sob a porta e encostou o queixo.
                - Preciso ser sincera com você. – O coração deu um salto.
                - Nós sempre fomos sinceros um com o outro. É só um lance entre nós, não é?
                - É.
                - Então? Não estou entendendo você. Não quer mais sair comigo?
                Ela ficou em silêncio. Soltou um sorriso com medo.
                - É isso? Fala! Você está me deixando nervoso. – Expressou entre dentes e com mau humor. Pat estranhou. Não sabia que ele se irritava com facilidade.
                - Tenho que confessar uma coisa. – Respirou pelo nariz, mas não soltou o ar pela boca. Não podia mais mudar de assunto. Quer dizer, se quisesse, podia. Uma situação complicada exigia saídas criativas. E Pat sabia fazer isso muito bem com “Mô”, um cara completamente previsível. Pelo menos é o que imaginava até aquela noite.
                Ele vestiu novamente a calça, abriu a porta e sentou no banco do motorista.
                - Estou ouvindo. – Mostrou irritação.
                - Nunca houve cobranças entre nós. Só que ultimamente você tem sido mais carinhoso que o normal. E eu não me sinto bem agindo assim. – Ela não estava mentindo.
                - Que parar de enrolar, droga! Fala logo de uma vez! – Gritou. Patrícia afastou-se receiosa – Desculpe! – Lamentou.
                Ela fitou o rosto dele. Inspirou novamente, criou coragem e prosseguiu:
                - Outro dia você me perguntou por que eu sempre te chamo de “Mô” e não pelo nome.
                - Eu lembro. E daí?
                - E daí que “Mô” para mim, não significa “amor”.
                - Não? – Espantou-se. – E significa o quê?
                - Motorista. – Revelou em voz alta, balançando a cabeça.
                “Mô” explodiu em gargalhadas durante uns quarenta segundos. Patrícia riu também.
Sem que ela pudesse esperar, ele parou de sorrir como um “stop” de DVD player, vociferou um palavrão e deu uma cotovelada no rosto dela. O impacto partiu na hora o supercílio. Em seguida, ainda agredindo-a verbalmente, empurrou-a violentamente para fora do carro. Deu partida e por pouco não a atropelou.
Sangrando e chorando muito, ela retirou o celular do bolso de trás da calça e bastante trêmula discou 1-9-0.
- Polícia Militar, boa noite. – Respondeu a voz feminina do outro lado.
- Alô... eu... queria falar com... o tenente... Paulo! – Balbuciou.
- Quem gostaria?
- A filha dele.   
(Trecho do romance "NABOA", ainda no prelo de minha autoria.)

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