A primeira coisa que disse quando voltou dos mortos foi: “Estou com sede! Quem pode me trazer um pouco d’água?”
Ali sim foi uma balbúrdia! Foi gente saindo pela janela, pela porta, pela cozinha, pelo telhado e por onde mais tivesse passagem o povo fugia desesperado. A falecida, depois ressurreta, ao se dar conta que a causa de todo aquele deus-nos-acuda era ela, e que estava assentada dentro do seu próprio caixão, deu um pulo incrível, tal qual salto com vara, e foi parar no meio da rua.
Deocleciano Pimenta não teve a mesma habilidade que Dona Janina, e nem pressa. Céo e Maria Marta, esta última com os olhos esbugalhados presos ao velho, o ajudaram a descer do caixão. Parecia que naquele momento toda a comunidade resolvera participar da brincadeira de estátua. Ninguém se mexeu. Todos foram tomados pelo susto e ficaram paralisados. Até os cachorros não tiravam os olhos do velho saindo de dentro do esquife. Deocleciano passou as mãos sobre o terno, retirando as últimas pétalas presas ao tecido, se agachou, pegou o chapéu e começou a descer a escadaria até a rua onde Pedro Parigot, também petrificado, acompanhou seus passos. Ao chegar ao último degrau, rente à calçada, foi que notou que ninguém mais se mexia.
- O inferno é assim? Este silêncio desgraçado? É festa, meu povo! Deocleciano voltou! – gritou.O coral começou a cantar alegremente. Até coreografia as pessoas fizeram. As crianças pulavam e dançavam no chafariz. À revelia do seu presidente, o conselho inteiro fez festa. Francisco pulava que nem criança, Maria Amélia ria sem parar, de felicidade. Tonho Deveras não parava de xingar, carinhosamente, Deocleciano, dizendo que ele não passava de um velho filho da puta cagado e sortudo. Até Jacinto, acamado há anos, apareceu na praça trazendo seu próprio leito para abraçar o ressurreto. Jafé, arrependido de ter insinuado que Deocleciano deveria passar seus derradeiros dias em Sem Pasto, observou tudo de longe, ao lado da esposa. Mas era notória sua alegria.
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