Era
setembro de 1987 quando a diretora da Escola Municipal Pequeno Príncipe me
disse que eu ia dar aula na quarta série. Dei um grito tão forte de
contentamento que a velha gestora quase teve um troço. Fui para casa pensando
num monte de estratégias, dinâmicas, jogos, brincadeiras para deixar meus
alunos com um desejo enorme de querer aprender. Eu viajava no meu quarto ensaiando
as aulas como se fosse uma peça de teatro e imaginava a cara dos meninos e das
meninas com os olhos esbugalhados pensando num monte de coisas.
Meu currículo tinha sido
selecionado, entre dezenas de outros, para uns contratos emergenciais que a
Secretaria de Educação estava realizando. Numa das cláusulas dizia que embora
fosse de três meses – também chamado por eles de período de adaptação, meu
contrato poderia ser prorrogado por até dois anos, se o contratado fizesse jus
e eu, certamente estava disposto a fazê-lo.
Fazer
pedagogia foi uma opção muito pessoal. Tive que ir de encontro a vários
obstáculos, entre eles, meus pais e minha namorada. Ninguém acreditava que eu
tinha escolhido um curso que ninguém mais acredita, dá pra acreditar?
“Cara, faz medicina, isso é que é
profissão!” berrava um amigo.“É
melhor ser advogado ou engenheiro, porcaria de professor!” dizia outro. “Ninguém mais quer ser professor! Faz
informática, meio ambiente, turismo, mas esquece isso!” Protestava meu pai.
Mas
eu queria ser pedagogo, queria nadar contra toda essa correnteza de descrença.
Eu não queria ser mais um, queria fazer a diferença e tinha certeza que meus
alunos iriam me ajudar nisso, mesmo sabendo que as escolas ainda continuavam
sendo dominadas por uma concepção pedagógica tradicional. Eu sei que podia
quebrar aquela ritualização de procedimentos escolares obsoletos, semelhantes a
planos pré-históricos, cujo método dominante era chamado de aula expositiva.
Estava
disposto a enfrentar um monstro que não se preocupava com o exercício da
cidadania, com o que os nossos alunos queriam ou não aprender; um monstro que
não estava nem aí para a formação do educando que sempre foi capaz de elaborar
conhecimentos, habilidades, atitudes, valores, formas de pensar e atuar nesta ou
em outra sociedade. Um monstro que fez da aprendizagem sinônimo de mecanização,
um monstro que não está aberto para o diálogo, nem tampouco para o processo de
rever conceitos. Um monstro chamado sistema.
Acontece
que eu cria nos avanços de todas as pesquisas na educação e no ensino; contava
com a ciência, a tecnologia e com as aulas que despertavam o gostinho de “quero
mais”. Com a força de vontade que brotava dentro de mim; com os sonhos que não
morriam; com os desejos que não paravam de germinar eu sabia que podia vencer. Sabia
também que só isso não bastaria. Era preciso mais do que novas metodologias,
recursos didáticos ou instrumentos tecnológicos.
Todavia,
minha fé na educação era maior que as dificuldades que haveriam de surgir.
Minha força de vencer era a prova das coisas que eu ainda não conseguia ver,
mas sabia que estavam lá, me esperando, torcendo, acreditando.
Entretanto,
eu queria que eles soubessem que educar é muito mais que um sacerdócio. “Educar
é um ato de amor[i]”.
Pawlo Cidade, escritor e ativista cultural.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por sua opinião. Volte sempre.