PEDRO
O poeta profetizou. Aquela
poesia do coração despirocado foi sinistra. Ele acertou na mosca! E eu achando
que havia exagerado ao confessar que ela beirava a insanidade. Perder a
virgindade num porão imundo de um auditório escolar em plena atividade
pedagógica, especialmente na hora do intervalo é no mínimo pirraça, doidice, excentricidade,
delírio! Falta adjetivo para compreender a proposta indecente e estapafúrdia
que a louca da Alice me fez.
“Então
me faça mulher aqui. Agora!”
Deus do céu! Será que ainda
eu tenho idade para viver experiências intensas que transformem meu coração
numa verdadeira bateria de escola de samba? Quando se é adolescente ou um jovem
à beira dos 20 anos você ainda se aventura meia-noite numa estrada deserta sem
medo de ser assaltado. Você é capaz de quebrar regras sem se preocupar com as
consequências. Afinal, você só tem 20 e um mundo inteiro pela frente para
corrigir as burrices que você cometeu. Aos 20 anos você é capaz de emendar a
balada da noite anterior com o trabalho da manhã seguinte às 7 horas. Pode
dormir o dia inteiro e virar 1, 2, 3 noites no carnaval e na quarta noite ainda
ter fôlego para pegar o cinema com aquela gata que você vem tentando ficar há
um tempo.
Aos 20 anos, ou quase 20, seus amigos são como
uma família incrível. Vocês criam dezenas de coisas juntos, são cúmplices,
escondem os segredos uns dos outros, cobrem as mentiras, farreiam juntos, tomam
banho juntos, dançam juntos, criam coreografia e gritos de guerra e todo mundo
namora junto.
Quando se chega à casa dos
30, a história é diferente. As decisões que você toma podem significar sua
vitória ou derrota, independência ou dependência, prisão ou liberdade. Um mundo
de escolhas que não lhe dá tempo, condições ou possibilidades. E daí? A vida
não é minha? Quer dizer que eu não posso mais viver perigosamente, tomar banho
nu na praia em noite de lua cheia, brincar de pega-pega com a mulher que eu
amo, fazer castelos de areia, beijar embaixo da chuva, transgredir a lei, pular
a cerca, subir num pé de coco, quebrar o telhado do vizinho, abrir os braços no
meio da rua e dá um grito de felicidade, namorar no banco da praça, chupar
sorvete de framboesa com flocos de brigadeiro, ouvir Down Under, da banda australiana Men at Work, mais alto que um trio elétrico e ainda fingir que toca
guitarra?
Infelizmente, como diz o bom
senso: Nem tudo que eu quero eu posso.
Nem tudo que eu posso eu devo e nem tudo que eu devo eu quero. Seu caráter lhe
dirá o que você quer, o que você pode e o que você deve. E, naquela estação,
aos 33 anos de idade com uma carreira se solidificando, carro seminovo, emprego
garantido, um pouco de dinheiro no banco e solteiro eu queria Alice, eu podia
ter Alice e eu acreditava no fundo da minha alma que pertencia a Alice.
As doces amargas memórias de Pedro e Alice, de Pawlo Cidade. Inédito.
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